Manobras básicas: o efeito do hélice em cada tipo de motorização

02/11/2023

A variedade de motorizações de embarcações reflete a complexidade e as demandas específicas de navegação em diferentes ambientes aquáticos e para diversos propósitos. Desde os tradicionais motores de centro até as sofisticadas turbinas a jato, as opções disponíveis oferecem uma gama diversificada de potência, eficiência e desempenho. A escolha da motorização certa para uma embarcação depende de fatores como tipo de navegação, condições do mar, carga e distância a percorrer. Com motores a gasolina, diesel, elétricos e híbridos, cada tipo de motorização traz suas próprias vantagens e desvantagens e são classificados da seguinte forma:

  • Eixo fixo (eixo e pé-de-galinha): Geralmente, o motor fica próximo ao centro do barco, ligado a um eixo preso na extremidade traseira com um mancal chamado de pé-de-galinha. O leme é independente do hélice.
  • Motor de popa: O conjunto motor e rabeta fica preso no espelho de popa do barco. O hélice vira junto com o motor.
  • Motor de centro-rabeta: Em lanchas, o motor fica dentro do barco (geralmente na popa) e a rabeta é presa no espelho de popa. O hélice gira junto com a rabeta e tem o mesmo efeito que o motor de popa na manobra. Em barcos maiores a rabeta (sail drive) é fixa abaixo da casa de máquinas e o leme é independente.
  • Propulsão hidro-jato: A propulsão é por bomba d'água (hidro-jato), e não por hélice, e a saída da bomba faz as vezes de leme do barco.

A força do hélice: Além de empurrar o barco para frente ou para trás, o hélice também gera uma força lateral, devido à diferença de pressão da água entre as pás. Por isto, a popa tende a ir para o bordo que o hélice gira; e, consequentemente, a proa vai para o lado oposto. Esse efeito do hélice é mais sensível quando o barco está parado e começa a se mover.

Exemplo: em barcos com hélice de passo direito (quando, olhando a embarcação pela popa, o hélice gira para a direita em marcha a vante), recomenda-se atracar por bombordo, porque o hélice vai girar para a esquerda em marcha a ré, puxando a popa para bombordo em direção ao cais.

Barco com eixo-fixo: A regra básica para qualquer tipo de propulsão é que, em marcha a vante, a proa sempre guinará para o bordo que estiver virado o timão. Nos barcos com cana-de-leme o sentido é inverso. Se puxar a cana de leme para bombordo, a proa guina para boreste e vice-versa.  Em barcos com leme grande, em marcha a ré, depois que a embarcação adquirir seguimento, a popa vira para o bordo que o timão estiver (se o timão estiver a boreste, o barco irá para boreste, em marcha a vante ou em marcha a ré).

Timão a boreste, a proa vai para boreste. Cana de leme a boreste, a proa vai para bombordo.

Em um barco com eixo fixo, deve-se levar em conta que em marcha a ré, partindo da imobilidade, o efeito do hélice predomina sobre a ação do leme. Então, partindo da imobilidade, a popa irá primeiro para o bordo para o qual o hélice gira; e somente após a embarcação ganhar seguimento é que a popa guinará para o bordo que o timão estiver virado.

Bow thruster: Para ajudar na docagem de barcos com eixo fixo (como trawlers, iates e veleiros de grande porte), existe uma propulsão auxiliar, normalmente com um motor elétrico, chamada bow thruster, conhecido também como propulsor de manobra de proa. Embutido na proa, num túnel perpendicular ao eixo da embarcação, esse equipamento gera uma pequena impulsão e permite guinar a frente do barco para qualquer bordo. Isso facilita as atracações em marinas apertadas. Existe também o propulsor lateral para a popa (stern thruster).

Barco com motor de popa ou centro-rabeta:  manobrar um barco com um motor de popa ou de centro-rabeta móvel (a grande maioria das lanchas de comprimento menor que 9 m) é muito mais fácil que um outro com eixo fixo, pois é o próprio hélice que gira, levando a popa para o bordo que o propulsor estiver. Em marcha a vante, virando-se o motor ou a rabeta para um bordo, a proa guinará rapidamente para este bordo. Em marcha a ré a popa geralmente guinará para o bordo que estiver o motor, mas com muito menor rapidez do que em marcha a vante. Isso ocorre porque, normalmente, os hélices utilizados em lanchas rápidas são pouco eficientes em marcha a ré.

Marcha a ré: se o motor estiver virado para bombordo, a popa vai para bombordo

Marcha a vante: se o motor estiver virado para boreste, a proa vai para boreste

Alguns barcos em marcha a ré não direcionam a popa para o mesmo lado do motor porque a força lateral do hélice predomina, principalmente quando o ângulo de virada do motor ou da rabeta é pequeno. Para eliminar o efeito desse empuxo lateral (e para melhorar a eficiência da propulsão), alguns fabricantes produzem rabetas com dois hélices contrarrotantes no mesmo eixo. As rabetas com hélices contrarrotantes eliminam a força lateral e facilitam a manobra.

Barcos que possuem a rabeta fixa (sail drive) e leme independente, se comportam dá mesma maneira que os barcos de eixo-fixo. Normalmente nestes barcos o motor é instalado invertido, com o eixo apontado para a proa e com a rabeta também invertida e instalada no fundo do barco ao invés de no espelho de popa. Desta de forma, o hélice fica localizado logo abaixo do motor otimizando o espaço da embarcação. Esta mesma configuração pode ser conseguida utilizando uma transmissão do tipo IV Drive, com um pequeno eixo pé de galinha que também deixa o hélice abaixo do motor. 

Barco com dois motores, dois eixos e dois lemes: Embarcações com dois eixos oferecem a vantagem de guinar independentemente dos lemes, utilizando-se somente os propulsores. Esses barcos têm hélices que normalmente giram para fora (o de boreste para a direita e o de bombordo para a esquerda, ou seja, contrarrotantes, mas cada um em um eixo, diferentemente dos hélices contrarrotantes utilizados em rabetas, que ficam no mesmo eixo). 


Quando apenas um dos propulsores é acionado, o barco tende a guinar para um dos bordos. Por exemplo: quando o motor de bombordo é posto a vante, a proa vai para boreste, e vice-versa. Em marcha-à-ré, a proa sempre segue para o bordo do motor acionado e a proa vai ao contrário. Se você é iniciante em manobras, o ideal é deixar os lemes a meio e usar somente os motores para vante ou para ré sem acelerar. Esse procedimento evita confusões. Com a prática, acostuma-se a usar os aceleradores e os lemes.

Uma maneira prática de visualizar isso é pegar um livro grande, deixá-lo numa mesa e com as mãos posicionadas nos cantos inferiores simular o efeito dos propulsores.

Reação do barco nas seguintes situações:

Com lemes a meio, motor de bombordo em neutro (ponto morto) e motor de boreste a vante, a proa vai para bombordo e o barco se movimenta devagar em círculos, no sentido anti-horário.

Com lemes a meio, motor de boreste em neutro e motor de bombordo a vante, a proa vai para boreste e o barco se movimenta devagar em círculos, no sentido horário.

Com lemes a meio, motor de bombordo em neutro e motor de boreste para trás (em marcha a ré), a popa vai para bombordo, a proa vai para boreste e o barco se movimenta devagar em círculos, no sentido horário.

Com lemes a meio, motor de boreste em neutro e motor de bombordo para trás, a popa vai para boreste e o barco se movimenta devagar em círculos, no sentido anti-horário.

Com lemes a bombordo, motor de bombordo em neutro e motor de boreste a vante, a proa vai para bombordo rapidamente e o barco se movimenta em círculos no sentido anti-horário.

Com lemes a boreste, motor de boreste em neutro e motor de bombordo a vante, a proa vai rapidamente para boreste e o barco se movimenta em círculos no sentido horário..

Com lemes a meio, motor de boreste a vante e motor de bombordo para trás, a embarcação gira sobre seu próprio eixo para bombordo. Se virar os lemes para bombordo, o giro é mais rápido, embora a popa vá levemente para boreste.

Com lemes a meio, motor de boreste em marcha a ré e motor de bombordo a vante, a embarcação gira sobre seu próprio eixo para boreste. Se virar os lemes para boreste, o giro é mais rápido, embora a popa vá ligeiramente para bombordo.

Motos aquáticas, jetboats e outros barcos com propulsão hidrojato:

Quando a propulsão de uma embarcação se dá por bomba d'água(como é nas motos aquáticas, jetboats e outros barcos com propulsão hidrojato),o comportamento em manobras depende muito da rotação do motor, porque a saída da bomba atua como leme do barco. Isso torna a pilotagem mais sensível e diferente de embarcações impulsionadas por hélices. É por isso que, se não usar o motor, um barco com esse tipo de propulsão não faz curva.

Muitos jetboats têm uma superfície plana no fundo do casco, na popa. Isso ajuda na captação de água para a bomba, mas deixa a popa deslizar em curvas. Portanto, deve-se levar essa característica em conta ao manobrar barcos com propulsão hidrojato, porque derrapam em curvas e, se o timão for virado totalmente para um dos bordos, podem dar cavalo-de-pau, por isso é preciso usar o acelerador para fazer as curvas.

Já, em marcha a ré, a grande maioria dos jetboats manobra ao contrário dos barcos com motor de popa e de centro-rabeta: ao virar o timão para boreste, a popa vai para bombordo e vice-versa. Muitos jetboats podem dar ré instantaneamente. Basta inverter o fluxo de água da bomba para a frente do barco. Embora não cause danos mecânicos no propulsor, essa manobra não deve, jamais, ser feita em alta velocidade, porque pode arremessar algum ocupante do barco violentamente para a frente. O princípio é o mesmo dos aviões a jato: na marcha a ré, há uma concha atrás da bomba que desvia a corrente de descarga (neste caso, o jato d'água) para a frente, o chamado reverso.

Dicas de manobras:

  • Toda manobra deve ser feita devagar, evitando-se ao máximo dar trancos na propulsão.
  • Dependendo do tipo de hélice, o barco reage mais rápido em marcha a vante do que em marcha a ré.
  • Barcos com dois motores de popa ou com dois motores de centro-rabeta são pouco eficientes em marcha a ré e manobram melhor a ré quando se viram os dois motores ou as duas rabetas para o mesmo lado (como se fossem um único motor).
  • Com dois motores de popa ou de centro-rabeta, tem-se a vantagem de poder virar os motores, mas, principalmente em marcha a ré, a resposta é mais lenta do que com dois motores com eixo e pé-de-galinha.

Em suma, o hélice desempenha um papel fundamental em cada tipo de motorização de barcos, sendo um componente essencial para a propulsão eficiente da embarcação. Desde os motores de eixo-fixo até os mais avançados motores de propulsão a jato, o design e o tamanho do hélice são adaptados para otimizar o desempenho e a eficiência de cada tipo de motor. A escolha adequada do hélice, em conjunto com a potência do motor e o tipo de casco da embarcação, influencia diretamente a velocidade, a estabilidade e a capacidade de manobra do barco em diferentes condições de navegação. Assim, compreender o efeito do hélice é essencial para garantir um desempenho ideal e uma experiência de navegação segura e agradável em uma variedade de ambientes aquáticos.